segunda-feira, 24 de maio de 2010

Cecília Meireles

Cântico II




Não sejas o de hoje.

Não suspires por ontens...

Não queiras ser o de amanhã.

Faça-te sem limites no tempo.

Vê a tua vida em todas as origens.

Em todas as existências.

Em todas as mortes.

E sabes que serás assim para sempre

Não queiras marcar a tua passagem.

Ela prossegue:

É a passagem que se continua.

É a eternidade.

És tu.

Cântico XVII



Perguntarão pela tua alma.

A alma que é ternura,

bondade,

tristeza,

amor.

Mas tu mostrarás a curva do teu vôo

livre, por entre os mundos...

E eles compreenderão que a alma pesa.

Que é um segundo corpo,

e mais amargo,

porque não se pode mostrar,

por que não se pode ver






Sou entre flor e nuvem,

estrela e mar

Por que havemos

de ser unicamente humanos,

limitados em chorar?



Não encontro caminhos

fáceis de andar.

Meu rosto vário

desorienta as firmes pedras

que não sabem de água e de ar.



E por isso levito.

É bom deixar

um pouco de ternura

e encanto indiferente

de herança, em cada lugar



Rastro de flor e estrela,

nuvem e mar.

Meu destino é mais longe

e meu passo mais rápido:

a sombra é que vai devagar.

Cecília Meireles

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